Birdman – A Inesperada Virtude da Ignorância (Birdman – or the unexpected virtue of ignorance, 2014) de Alejandro Gonzáles Iñarritu
O filme: a trama segue o ator Riggan Thomson (Michael Keaton), que 22 anos após interpretar um super-herói do cinema, decide montar uma produção na Broadway. A aposta é somente a sua carreira, hoje estagnada.
No processo criativo, Riggan tem de lidar com seu alter-ego (Birdman), um ótimo, mas problemático ator (Edward Norton, excepcional), sua namorada que pode estar grávida (Andrea Riseborough), sua filha e assistente (Emma Stone) que saiu de uma clínica de reabilitação, seu agente (Zack Galifianackis), sua ex-mulher (Amy Ryan), uma estrela insegura (Naomi Watts) e uma crítica de teatro que deseja enterrar sua carreira.
Porque assistir: indicado a nove categorias, venceu o Oscar de melhor filme, diretor (Alejandro Gonzáles Iñarritu), roteiro original e fotografia. Fita também concorreu ao Leão de Ouro em Veneza, e ganhou quatro prêmios especiais no festival.
Obra complexa, é uma crítica criativa ao grande mercado de Hollywood, seus filmes pipoca e astros de ego inflamados. Ecos de Cisne Negro (2011), uma montagem que faz de conta que o filme é um plano sequência só, solos de bateria e um elenco inflamado em talento com suas cenas-chave.
Como o protagonista que nos guia pelos meandros de uma produção da Broadway, Michael Keaton traduz loucura em capacidade de renascimento artístico em uma entrega incrível. Logo em um papel que tem paralelos enormes com sua própria carreira. Ele, o Batman de 1989 e 1992, que recusou outras continuações para fazer coisas comuns. Foi esquecido pelos holofotes e essa é a sua volta por cima, com direito a Globo de Ouro de melhor ator (comédia ou musical) e indicação ao Oscar pela bela interpretação.
Melhores momentos: filmado e montado de maneira tal qual o espectador pense estar assistindo a uma só sequência sem cortes, o drama cômico inebria com sua série de acontecimentos.
O conflito psicológico entre o ator Riggan Thomson e seu personagem, Birdman, impressiona, e a cena que abre o filme e o personagem levita, já diz a que veio. E em que tom imaginativo.
A conversa mais que séria, que acaba em discussão de lado a lado, onde verdades são jogadas com gosto entre filha (Emma Stone) e pai (Michael Keaton), deixa o espectador desconcertado.
E o que dizer do que seria um papo amigável entre o ator e uma crítica de teatro em um balcão de um bar? Uma sequência incrível, que começa na esperança de um ex-astro em permanecer vivo/ser reconhecido artisticamente, e uma jornalista, que simplesmente quer passar por cima – antes mesmo de ver a peça – do que chama de lixo.
Mas, e como esquecer a voltinha na Times Square de cuecas? Seguido por um retorno triunfal no palco, quase que todo de improviso.
Em nuance, a máscara de Birdman reaparece no rosto de Riggan Thomson, enquanto o ator está no hospital. Perceba. Além, é claro, do final poético, que faz nossa mente voar para o mundo da imaginação.
Pontos fracos: sinceramente, desconheço. Tente entrar na viagem da história e personagens, principalmente do seu protagonista.
Na prateleira da sua casa: a produção já está disponível em DVD e Blu-ray pela Fox, além de cópia digital pelo iTunes. Entre os extras se destacam o especial “Birdman: acesso completo” e galerias: Chico no Set, disponíveis em DVD. Na cópia em Blu-ray há a adição de “uma conversa com Michael Keaton e Alejandro G. Iñárritu”.
No elenco, Edward Norton e Emma Stone foram indicados ao Oscar e Globo de Ouro de coadjuvantes, respectivamente. Há ainda Amy Ryan (indicada ao Oscar de coadjuvante por Medo da Verdade, 2007), Naomi Watts (indicada ao Oscar por O Impossível, 2012) e Zach Galifianackis (Se Beber, Não Case!).
No comando de tudo, o cineasta Alejandro Gonzáles Iñarritu. Sua assinatura traduz em forte em carga dramática, vide Amores Brutos (2000) – premiado em Cannes e indicado ao Oscar de filme estrangeiro (México), 21 Gramas (2003) – nomeado ao Leão de Ouro em Veneza, Babel (2006) – indicado ao Oscar de melhor filme e direção – e Biutiful (2010), pelo qual concorreu à Palma de Ouro em Cannes e indicado ao Oscar de filme estrangeiro (México). Mas Iñarritu vai além e surpreende em sua condução ácida, e de teor crítico, que flerta até com o humor negro em sua “Inesperada Virtude da Ignorância”.
Um filme para se ver e rever. Uma comédia dramática que brinca e deixa você entre o que é real e o que é irreal. Uma linha tênue entre a sanidade e a insanidade humana transborda na tela. Uma obra ambiciosa e metalinguística, mas que funciona em todas as suas apostas geniais.