Ninguém imaginou que John Ford conseguiria filmar Nos Tempos da Diligência (Stagecoach, 1939). O diretor vencedor do Oscar pelo thriller O Delator (1935) imagina um western épico, filmado em locações reais, no Monument Valley, no árido Arizona, na fronteira com Utah. A ideia de adaptar um conto de Ernest Haycox (“The Stage to Lordsburg”) era desafiadora. A trama acompanha uma viagem de diligências em todo o Oeste americano, com a previsão de várias de sequências de ação.
Em 1938 não havia nenhuma estrada pavimentada através de Monument Valley, e era inviável levar equipamentos para filmagens naquele local. Razão pela qual ainda não tinha sido utilizado como um local de filme antes. Além disso os westerns (de primeira linha) haviam sido deixados de lado com a produção de filmes falados.
Contudo, para a primeira das 14 colaborações entre o diretor John Ford e o astro John Wayne, tudo conspirou a favor da produção de um dos melhores faroestes da história do cinema. O cineasta conseguiu encaixar o projeto com um produtor independente, e assim ficou livre do controle dos estúdios de Hollywood. Bom também para Wayne, que era visto como um ator de filmes B, e que finalmente conquistava público e crítica.
Voltando a história do filme, acompanhamos um grupo de pessoas um tanto diferentes, mas que estão juntas com o mesmo objetivo: atravessar o país dentro de uma diligência em perigo constante. Ao longo da viagem, o clima é claustrofóbico (todos os interiores do filme possuem tetos), e, liderados por um destemido cowboy, Ringo Kid (John Wayne), o grupo luta contra desastres naturais, e ataques de bandidos e índios, incluindo o bando de Gerônimo.
Em pleno Deserto de Mojave, John Ford apresenta seu protagonista em uma cena memorável. Entre o distanciamento quase sem foco, até um enquadramento perfeito, temos a indecisão entre o que é certo e errado. Com essa sequência, tudo que precisamos saber é na verdade uma pergunta: Afinal, devemos confiar neste homem?
Dentro da diligência, o que se vê no grupo de personagens é microcosmo de uma sociedade cheia de camadas. Inevitavelmente veremos confrontos particulares, que colocam à prova o caráter de alguns, enquanto outros até revivem fantasmas do passado em busca de uma segunda chance.
Além dos conflitos internos, o faroeste apresenta também o perigo eminente de um ataque indígena. E quando a ação explode na tela, o que se vê é um alto grau de realismo imposto por John Ford. Mas é importante ressaltar que, com a ajuda de um conjunto técnico perfeito, incluindo aí o trio fotografia, montagem e trilha sonora. Ao apontar suas câmeras para paisagens naturais gigantescas tão – e em contraponto às sequências fechadas que emitem tensão – as imagens abraçam a grandiosidade do local em forma de panorâmicas inesquecíveis.
Indicado para sete Oscar (melhor filme, diretor, montagem, fotografia P&B, direção de arte, trilha sonora e ator coadjuvante-Thomas Mitchell), vencendo os dois últimos, o filme é demais. eleito como um dos 10 melhores filmes de 1939 pelo National Board of Review, No Tempo das Diligências é uma obra-prima obrigatória. Para se ver e rever. E de novo. E novamente. E outra vez.
Lançado pela distribuidora Classicline, o DVD vem em embalagem tradicional, porém com caixa transparente, capa dupla face e em DVD duplo. O primeiro disco contém o filme (dublado e legendado), e o segundo exclusivo com extras do western (vídeos especiais; galeria de pôsteres; entrevista com John Ford; biografia e filmografia do diretor), porém sem legendas.