Há 29 edições, desde 1994, o San Antonio Film Festival atrai amantes do cinema, e seu público inclui imprensa, celebridades, cineastas, líderes da indústria e fãs obstinados. A edição deste ano ocorre entre os dias 1º e 6 de agosto em San Antonio, Texas. A seleção oficial foi anunciada há pouco, e “Apaga-me”, do diretor e roteirista cearense Lucas Paz, destaca-se como um dos concorrentes brasileiros nas categorias Prêmio do Júri de Melhor Curta Narrativo, Prêmio do Público de Melhor Narrativa, Prêmio do Júri de Melhor Performance.
O curta já soma 7 prêmios de melhor curta narrativo, melhor fotografia, melhor ator coadjuvante, honra ao mérito ao ator João Sales (protagonista), melhor maquiagem, melhor cabelo e melhor figurino no Reino Unido, Estados Unidos e no Brasil, e também foi selecionado para festival na França. Ainda em agosto o curta participará do Festival Angaelica na Califórnia.
“Estamos radiantes com o reconhecimento de nossa história ao redor do mundo, sermos selecionados para um dos festivais mais competitivos do globo, o 29 San Antonio Film Festival é incrível e abre portas para nossa mensagem em busca de respeito e humanidade à comunidade Trans. ‘Apaga-me’ trata com visceralidade de aborto paterno e de justiça social à comunidade Trans no mundo e no Brasil, país com a maior parada LGBTQIA+ e que mais mata a população LGBTQIA+ no planeta. Havemos de mudar isso de vez! Recém-saídos do mês de celebração do Orgulho LGBTQIA+, esse filme é um grito por justiça a Dandara, mulher trans brutalmente assassinada no Ceará, e uma ode a artista plástica Márcia Mendonça, a Veronica Valenttino e tantos outros talentos trans Brasil afora. LGBTFobia é crime, nosso filme é de denúncia e reflexão sobre o quanto evoluímos enquanto sociedade desde os anos 80, auge da estigmatização do povo LGBTQIA+. Aqui, apesar de todos os traumas e dores indeléveis, nossa heroína Lúcia mostra que basta de violência e que justiça se faz com a aplicação da lei. Apaga-me é um dedo na ferida da hipocrisia, do preconceito velado, da violência descarada, da necessidade de ação urgente do Estado e um chamado à aceitação, ao respeito, ao amor e à humanidade”, justificou o cineasta.
“Apaga-me” conta a história de uma transtornada, mas determinada mulher trans preta que trabalha como stripper para economizar dinheiro para sua redesignação sexual e descobre que um cirurgião plástico abusivo é o pai biológico que ela está procurando. Invisibilidade, dor e marginalidade permeiam uma era indefinida entre os anos 1987 e 2023 onde “aborto paterno”, prostituição, AIDS, tratamento do HIV, abuso de drogas e abuso sexual pintam as camadas internas de um cenário de beleza e ideação como superfície. Lúcia trabalha em condições precárias em modo de sobrevivência, sonhando com o dia em que conhecerá seu pai pela primeira vez, em seu verdadeiro eu. Identidade e conexão familiar são a chave para a humanidade de Lúcia. Abandono e abuso moldam a difícil jornada que ela enfrenta em sua busca por respostas. Um cirurgião plástico pode apontar o caminho para a redenção, o trauma ou a descrença. Aprender com a dor. Mudar seu reflexo. Abraçar a si mesmo. Fazer valer a justiça.
Esta é uma ficção narrativa construída a partir de relatos no centro de apoio a pessoas trans de Los Angeles, colhidos durante dois meses. A pesquisa revela que muitas vezes a questão identitária da pessoa trans não está ligada à como ela se enxerga em sua expressão de gênero, mas em como a sociedade a subjuga. Apaga-me questiona “avanços” sociais desde 1987, auge do estigma gerado sobre a AIDS, abandono familiar, violência nos espaços sociais e de trabalho.
“Tive a honra de trabalhar com um elenco entregue, ávido por pesquisa e de bastante reconhecimento profissional os atores João Sales (preparador de ‘Um toque de Aurora’, filme que produzi para a Amazon Prime Video, com Al Danuzio e Thaila Ayala), Andre Engacia Mello (Teat(r)o Oficina de Zé Celso Martinez Corrêa), Thalma de Freitas atriz e cantora (Globo) e Daniela Escobar (Globo)”, concluiu Lucas Paz.
Curiosidades sobre o processo criativo de “Apaga-me”:
Os grandes inspiradores de “Apaga-me” são Gaspar Noé, Nelson Rodrigues, Jorge Amado, Lars Von Trier e Almodóvar. Em “Apaga-me” nenhum dos personagens é digno de pena, visceralidade e naturalismo sintetizam bem a estética da obra;
“Apaga-me” nasce baseado em “Plástica”, poema que o autor e diretor escreveu em maio de 2013;
Lucas frequentou o “Transgender Perceptions Support Group” em Hollywood, todas as sextas feiras durante 2 meses como forma de se aproximar e entender melhor o universo criativo e social que aborda;
Para as sessões de casting, o realizador foi acompanhado de seus assistentes a bares LGBT de West Hollywood para entrevistar transgêneros e drag queens que estivessem a fim de se envolver com o projeto;
O filme se passa nos anos 80, período em que a discriminação e a ignorância com relação a transgêneros eram bastante elevadas, como forma de distanciar o público da realidade retratada e assim conduzi-los numa jornada emocional, mas também reflexiva. No entanto, o filme apresenta sutis elementos da atualidade como forma de conectar a plateia e aguçar a curiosidade de um público leigo e de um público especializado em relação a determinados símbolos apresentados na telona;
Com 75% do elenco brasileiro, o cineasta logo percebeu que o projeto tinha uma força expressiva peculiar à sua cultura de origem se falado na língua pátria, com uma identificação social e temática muito mais próxima aos atores brasileiros;
Lucas Paz resolveu reformular o elenco e um dos atores que faziam um papel secundário, João Sales, merecidamente conquistou o papel de protagonista da trama, contracenando com André Engracia, O elenco também conta com Thalma de Freitas, Daniela Escobar e as promissoras Isabela Valotti, Sabrina Percario e Marinah Moser;
Prezando por sua experiência no teatro, o diretor desenvolveu com os atores um processo curto, mas intenso de preparação que envolvia desde jogos, improvisos, Viewpoints, análise ativa de cena a aulas básicas de strip burlesco com Nina Minneli e pole-dance com Alexandria Sanders, como coreografia de luta com Adam Gomez;
A produção ficou por conta de (PRE)FORMA-SE Artistic Productions, Gustave Whinnery, Sabrina Percario;
A equipe técnica e de colaboradores é mais uma vez bem diversificada internacionalmente e o filme ainda conta com quatro peças originais de “Imagos” e mais cinco quadros exclusivos da reconhecida artista mexicana Erika Harrsch, dispostos nos diferentes cenários retratados. Erika já teve suas obras em filmes como “Só Deus Sabe”, com Diego Luna e Alice Braga;
O diretor cearense havia visto a obra de Erika Harrsch em 2007 em SP, e sua exposição “Imagos” ficou marcada em sua memória até o dia em que Lucas percebeu que as obras da artista dialogavam fortemente com o conteúdo de seu filme;
Veronica Valenttino, ganhadora do prêmio Shell de melhor atriz e talento musical cearense conhecida internacionalmente por sua antropofagia de estilos e épocas tem “Testemunho de Trava” como uma das faixas da trilha sonora;
O filme foi rodado em apenas cinco dias em Los Angeles, com um elenco de 14 atores e 30 membros da equipe técnica;
O filme teve sua primeira exibição privada no teatro da Warner Brothers; “Apaga-me” é uma obra que salta do estereótipo do preconceito para a busca pelo amor e aceite da família;
Com cópias com legendas em português e inglês, o filme do diretor cearense Lucas Paz pretende rodar os mais respeitados festivais internacionais.