Uncharted – Fora do Mapa (2022) de Ruben Fleischer
Há dois pontos que gostaria de trazer ao leitor para começar esta crítica.
Primeiro que uma adaptação significa mudança, quase obrigatoriamente, algo que infelizmente o senso comum não compreende. Segundo, aviso a todos que eu sou fã dos jogos da série Uncharted. Joguei todos os jogos, sendo assim, esse longa se torna especial para mim e adianto que considero o resultado desse filme como extremamente positivo.
Baseado nas séries de jogos da produtora de jogos Naughty Dog, o filme nos apresenta a Nathan Drake (Tom Holland), um jovem aficionado desde a infância por História, mas que atualmente ganha a vida trabalhando como bartender e fazendo pequenos furtos. Até que ele conhece Victor Sullivan (Mark Wahlberg), um ladrão de especiarias, que convence a “Nate” a embarcar em busca de um tesouro perdido há 500 anos. “Sully” foi parceiro do irmão de Drake, que não o vê desde criança e que no momento está desaparecido.
Mas é claro que a busca não será tão fácil. Tal tesouro pertenceu no passado à “Família Moncada” que, no passado, foram enganados por piratas. Santiago Moncada (Antonio Banderas) está obcecado em recuperar a riqueza que pertenceu à sua família. Isso leva nosso antagonista a se juntar com a mercenária Braddock (Tati Gabrielle), que comanda um exército paramilitar. Então uma corrida contra o tempo se inicia na perseguição desse tesouro perdido, entre várias pistas, reviravoltas, muita ação e aventura.
A essência de Uncharted (eu não comentarei o subtítulo brasileiro ridículo, que tenta “explicar” a trama do filme), está toda aqui, mas com diferenças significativas em relação ao material original. O diretor Ruben Fleischer (o mesmo da adaptação de Venon; dos dois Zumbilândia; e Caça aos Gângsteres) cria uma narrativa gamificada, ou seja, vamos do ponto A ao B, onde cada cenário serve como uma fase. Entretanto, nunca perdendo a noção que estamos vendo um longa. Outro mérito é saber que a franquia de jogos, baseada na cultura Pulp, se inspira nos filmes Indiana Jones e nos games de Tomb Raider e abraça os clichês sem medo. Inclusive a película faz referência a uma cena específica do terceiro jogo (avião) e tem influências da trama do quarto game como uma grande homenagem.
E apesar da ação atenuada em relação aos jogos (onde realmente há muita matança), a fotografia do experiente Chung-hoon Chung (“Oldboy”, “A Criada”, “Última Noite em Soho”), juntamente com design de produção de Shepherd Frankel, cria cenários muitas vezes críveis e que auxiliam na busca do tesouro. Já nas cenas de ação, nunca ficamos perdidos devido à precisa mise-en-scène. Uma pena que a trilha sonora de Ramin Djawadi não dá o tom épico ao longa.
Mas as diferenças moram na relação dos personagens. Por mais que não haja honra entre ladrões e a personagem de Chloe Frazer (Sophia Ali), uma mercenária que também está atrás do tesouro, não se demostra isso junto com Sully e muito menos entre os antagonistas.
O longa serve realmente como um início de tudo. Nate e Sully, formam uma parceria e se conhecem durante a película tendo muita desconfiança um no outro. Drake tem um coração puro demais e tom sarcástico do personagem está bem abaixo para quem jogou os jogos, pertencendo essa característica a Sullivan. Os vilões, por mais que unidimensionais, entregam características menos maniqueístas (por incrível que pareça) do que nos games.
Entretanto, meu maior receio ao ver o filme era a caracterização de Nate e Sully. Tanto Tom Hollande Mark Wahlberg são jovens demais, comparados aos que conhecemos no material base. Mas a química da dupla é tão boa que todas as mudanças adaptadas funcionam, principalmente, levando em conta que esse é o primeiro contato entre os dois personagens. Méritos do time de roteiristas, acredite são cinco, entre adaptação, história, reescrita e roteiro final: Rafe Judkins, Art Marcum, Matt Holloway, Jon Hanley Rosenberg e Mark D. Walker que tiveram aval da Naughty Dog.
Sem entrar no campo de spoilers, o longa termina geralmente como a maioria dos jogos termina. Entretanto, foi uma escolha que considero perfeita para o início do que pode ser uma franquia cinematográfica. Aos não iniciados nos jogos pode até ser um desfecho considerado insatisfatório, principalmente para o público, que não é obrigado a conhecer a mensagem que os games repetem e que muda somente no último jogo.
Não sei como será a reação dos fãs mais fervorosos e muito menos do público que não conhece os jogos, mas o produto final, Uncharted – Fora do Mapa é uma adaptação de games que funciona muito bem. Mudanças foram feitas, entretanto nenhuma que faça com que a essência seja perdida. “Sic Parvis Magna” ou “A grandiosidade vem das pequenas coisas” (frase clássica que Nathan leva consigo em um amuleto), e que esse seja o primeiro passo para uma nova franquia de filmes.