Noites de Alface (2021) de Zeca Ferreira
Noites de Alface primeiro longa de Zeca Ferreira, e baseado no livro homônimo da escritora Vanessa Bárbara, tem caráter experimental trazendo uma trama estranha que, apesar de instigante, sofre com grandes problemas por não conseguir equilibrar gêneros na história que deseja contar.
Otto (Everaldo Pontes) é um homem reservado que, depois da morte de sua esposa Ada (Marieta Severo), começa sofrer com insônia. Para dormir ele utiliza uma receita que Ada deixou para ele: chá de alface. Otto vive em uma pacata cidade no interior e recluso em casa passa a observar a vizinhança que parece esconder um segredo depois que o carteiro da região some. Então ele começa a procurar respostas para o que está acontecendo, enquanto mistura o presente e o passado da sua própria história.
Qualquer sinopse que estivesse aqui nessa crítica não conseguiria representar com exatidão a confusão da história do filme. Ferreira usa uma abordagem experimental para contar sua narrativa e cria uma verdadeiro quebra-cabeças onírico que vai se montando aos poucos. Contudo, se perde em diversos gêneros e subtramas sem conseguir transmitir uma mensagem clara do que se trata o longa.
A película tenta ser um drama sob solidão e perda, um thriller psicológico e uma história de crime, porém não consegue ser nenhum deles direito. Enquanto tentamos entender o que está acontecendo, o filme até que instiga em alguns pontos prendendo o espectador até chegar a um final, olha só, coeso. Porém a confusão narrativa criada durante todo o seu percurso, não ajuda.
Otto mistura realidade, presente e passado. É personagem que apesar de move o filme para frente é muito passivo. Ada parece uma personagem viva (apesar de já morta) é mais ativa. A fotografia marca bem essa dualidade desses personagens, com Otto sempre no escuro e Ada sempre no dia.
A trama se confunde também com um livro que Otto está lendo, o que potencializa os mistérios oníricos do longa. Estamos na cabeça de Otto e suas percepções confusas de realidade.
O ponto forte do filme é a vizinhança. A estranheza da pequena comunidade e seus personagens é o que faz o espectador ficar interessado na trama. Temos diversos vizinhos que instigam o público com sua excentricidade. O Farmacêutico Nino (João Pedro Zappa), a excêntrica Dona Iolanda (Teuda Bara), a dona dos cachorros bagunceiros, Tereza (Inês Peixoto), Mayu (Lumi Kim) e seu avô ex-combatente de guerra que sofre de Alzheimer e os carteiros Anibal (Romeu Evaristo) e Aidan (Pedro Monteiro). Todos parecem esconder algo a Otto e participar e perceber seu universo onírico.
Porém, o filme carece de unidade narrativa e não consegue explorar suas mensagens. Os inúmeros gêneros propostos não conversam tão bem e vemos a confusão de Otto ser parte da narrativa ruim. No final do longa toda confusão se resolve sem um peso dramático forte.
Curioso como seu título, Noites de Alface é um longa estanho, mas muito mais porque tenta ser muita coisa ao mesmo tempo, mesmo sem acertar em tudo. É uma narrativa experimental que apesar de ter pontos que as vezes pontuam um quebra-cabeça interessante, soa confuso desnecessariamente.