Shang-Chi e a Lenda dos Dez Anéis (2021) por Destin Daniel Cretton
A quarta fase do MCU (Marvel Cinematic Universe) ainda está longe de acabar e com certeza promete trazer surpresas aos fãs. Mas ouso dizer que dentre as produções desse novo ciclo, Shang-Chi e a Lenda dos Dez Anéis tem tudo para ser especial. Apesar de não tocar no ponto crucial que cada vez mais está se consolidando na Marvel: O Multiverso. Bem, não completamente.
Depois do final épico com Vingadores: Ultimato que “finalizou” a “Saga do Infinito” (as aspas em finalizou é devido Homem-Aranha: Longe de Casa marcar o fim de fato de todo ciclo construído nesses 23 longas), algo que nem os fãs mais otimistas esperavam ver no cinema. As expectativas sobre os próximos passos da Marvel com seu universo eram enormes. A fase quatro começaria com filmes e séries disponíveis no serviço de streaming: Disney + (WandaVision, Falcão e o Soldado Invernal, Loki e What If…?, esse último ainda em andamento), em conjunto. Mas devido a pandemia que assolou o planeta, o planejamento teve de ser alterado.
Já no cinema, a quarta fase abre com Viúva Negra. De fato, Shang-Chi é o novo herói apresentado para integrar o panteão do MCU. Mas o longa, assim como estrelado por Scarlett Johansson, faz referências ao passado, entretanto aqui, introduzindo elementos mais significativos para o futuro.
Aqui conhecemos de fato o verdadeiro Mandarim. Vilão do longa Homem de Ferro 3, que na verdade era apenas um ator de teatro (Ben Kingsley), que utilizou o grupo terrorista: Os Dez anéis e inventou um nome qualquer do para o líder organização, enganando Tony Stark (algo que irritou bastante os fãs na época). Houve então uma correção através de um curta chamado “Todos Saúdam o Rei”, onde descobrimos que o nome do impostor é Jackson Norris, que está na prisão com medo de ser capturado pelo “original”.
Mandarim ou melhor Xu Wenwu (Tony Leung), é um guerreiro milenar que achou dez anéis (que aqui são argolas, uma boa sacada porque faz total sentido com peças indumentárias em artes marciais), ganhando poderes e não envelhecendo. Com a posse dos artefatos místicos, ele praticamente conquistou tudo o que quis e criou a organização já citada acima (onde a primeira aparição foi no primeiro Homem de Ferro), que age desde o começo da história humana.
Querendo mais poder, Wenwu vai atrás da cidade lendária de “Ta-Lo”, mas antes de conseguir entrar é parado por Li (Fala Chen), protetora do local. Os dois se apaixonam, renunciam seus poderes e tem dois filhos: Shang-Chi (Simu Liu) e Xialing (Meng‘er Zhang). Entretanto, sua esposa morre, acendendo o ódio no vilão novamente. Que começa a treinar seu filho para ser o maior assassino do mundo. Chi, com apenas 14 anos, é mandado para missão, porém acaba fugindo e desaparecendo.
Saltamos no tempo e agora utilizando o nome Shaun, nosso protagonista vive uma vida simples e junto com sua amiga Katy (Awkwafina), trabalhando juntos como chofer de carros. Até que um dia, seu Pai manda seus capangas roubarem o pingente de Chan e sua irmã desaparecida que pertencia a sua Mãe. Um artifício para unir a família novamente e obter um mapa com o plano de invadir “Ta-Lo” novamente e resgatar a sua mulher que acredita não ter morrido e sim que está presa na cidade.
Shang-Chi segue a “Fórmula Marvel” à risca. Podemos dividir o longa em duas partes: A primeira é um filme mediano, urbano, com o humor sagaz, que muitas vezes estraga o ritmo, que se salva devido a ação muito acima da média. Já a segunda, é uma narrativa em um tom crescente, que vai surpreendendo o espectador. Fora que um universo fantástico é nos apresentado sendo uma das mais belas produções do estúdio.
A primeira coisa a se notar no longa é a representatividade. Aqui como em Pantera Negra, a maior parte do elenco tem a etnia do protagonista (no caso aqui de asiáticos). A Marvel tomou bastante cuidado para não cometer gafes ao representar de forma errônea a cultura oriental. Inclusive porque o mercado Chinês é um dos maiores do mundo. Kevin Feige (o produtor que organiza todo o MCU), tratou inclusive de excluir qualquer menção a Fu-Manchu: personagem clássico, que representava de forma estereotipada os orientais e originalmente foi o pai de Shang-Chi nas HQs.
A direção de Destin Daniel Cretton é inventiva, principalmente nas cenas de ação. Em certos momentos as lutas são como uma dança (características do Kung Fu), com a câmera se movimentando ao redor dos personagens e slow motion e cortes pontuais (Lembrando o longa “Herói” e até mesmo a animação “Avatar: A Lenda de Aang”). Outros embates, principalmente na primeira metade, a montagem é mais rápida e com planos longos, porém não atrapalha o entendimento do espectador. Méritos do coreógrafo Andy Cheng e da editora Elísabet Ronaldsdóttir.
O personagem é bem mais realista do que nas HQs. inclusive várias mudanças para o MCU foram tomadas. Como dar um grau de parentesco entre Wenwu e o protagonista. Chi não tem habilidades exageradas (pelo menos até o terceiro ato). Inclusive o apelido “Mestre do Kung Fu”, não é citado durante o longa. Os anéis de seu Pai também sofreram mudanças. Aqui se trata mais de rajadas de energias lançadas contra o inimigo.
A fotografia Bill Pope transita bem entre o urbano e fantástico de maneira orgânica. Utilizando cores mais sóbrias no ambiente da cidade ou quando mostra o antagonista e cores completamente vivas e coloridas quando conhecemos o fantástico, mérito compartilhado com o diretor de arte Jan Edwards que se inspirou na estética do clássico: “O Tigre e o Dragão”. inclusive Michelle Yeoh, uma personagem fundamental no longa de Ang Lee. Faz a Tia de Chi e sua irmã, a personagem Ying Nan.
Kate é o alívio cômico do longa e fiel amiga do protagonista. Uma sidekick, que tem uma evolução na trama sendo fundamental em certos momentos. A Marvel quase quebra o paradigma que transformar personagens secundárias em interesse romântico. Infelizmente, fica subtendido que eles serão um casal. A irmã de Shang também tem um arco dramático fundamental: tanto na ação como na construção do conceito de família.
Mas como já citado é na segunda metade e principalmente no terceiro ato que o filme ganha tons épicos. O longa se torna uma verdadeira celebração e homenagem à beleza e cultura oriental. Criaturas mitológicas se fazem presentes (posso estar enganado, mas estou colocando a palavra “oriental” ao invés de apenas “chinesa”, pois acho que é diretor abrangeu mais de uma mitologia).
A batalha final é um grande deleite. Nesse momento o longa se dá a liberdade de explorar todo o potencial fantástico do universo exposto, inclusive referenciando as HQs do herói. O protagonista finalmente utiliza seu lado místico até antes contido. Além do confronto inevitável com seu pai, o filme entrega uma surpresa que vai alegrar demais os fãs dos quadrinhos de longa data.
Shang-Chi e a Lenda dos Dez Anéis é um filme que começa morno e termina épico. Com muita ação, o longa é uma carta de amor à cultura oriental. Qual será o futuro do personagem? Ninguém sabe ao certo, porém, bem-vindo ao MCU.
Antes de terminar, lembrem-se que eu cito que o longa não toca no assunto do Multiverso. Bem, pense de novo, pois um filme da Marvel somente acaba após créditos finais.