O número de emergência 911, é uma versão americana do nosso 190 aqui no Brasil. Do outro lado da linha há – em tese, uma atendente psicologicamente preparada para levantar os dados necessários e enviar o socorro para cada chamado específico na tentativa de resolver a ocorrência.
E o suspense “Chamada de Emergência” (The Call, 2013) de Brad Anderson parte de uma história na central do 911 de Los Angeles.
Sua protagonista é uma Jordan (Halle Berry) atendente do 911 traumatizada por errar e provocar o assassinato de uma jovem que estava ao telefone com ela, que, meses depois tem a chance de superar o caso e se redimir ao colaborar com a polícia na solução de um sequestro de outra garota, Casey (Abigail Breslin), que pode evoluir para assassinato. Detalhe, o suspeito (Michael Eklund) é, possivelmente, o mesmo do crime anterior. Pois é, mas a ligação, ops, o filme é um verdadeiro trote.
Furos no roteiro
Trama muito conveniente para expor uma tentativa de volta por cima, ou uma espécia de acero de contas com o passado pesado. E os furos na história não cansam de aparecer. Um serial killer que age durante o dia? No meio do expediente? E outra, o teor doentio de um vilão – sem muita inteligência – é realmente bizarro. E completamente sem sentido. Como alguém que deixa tantas pistas em seus crime pode permanecer por tanto tempo solto? Uma história secreta de amor com a irmã?
Vamos continuar. Um braço para fora de uma porta-malas de um carro, em plena via expressa, e somente uma pessoa repara? A tinta no chão, ninguém sabe, ninguém viu… Ah, ok, uma pessoa foi conferir do que se tratava e… Um assassinato no meio de tudo? E – de novo – ninguém percebe nada. A polícia encontra o possível local do cativeiro, mas, após uma busca superficial e não encontrar nada, vai embora. Não isola o local, não examina pistas, enfim não procura direito! Parece que estão brincando de investigar.
Mais bizarrices em seguida. Como explicar que toda a central do 911 drasticamente pára para acompanhar a história do sequestro em curso? A própria abertura do longa tratou de explicar que as ocorrências são inúmeras e de uma variedade impressionante, num trabalho estressante, quase non-stop.
Como explicar que uma atendente de 911 praticamente se transforma numa investigadora perita, tipo agente do FBI, na busca desenfreada pelo assassino? Como uma questão de honra, de cumprir sua palavra para com a pessoa do outro lado da linha. Coisa que a mesma atendente, ao dar uma aula para aprendizes do atendimento, afirmou que NUNCA deveria ser feito: prometer.
Diretor e roteirista
Sim, “Chamada de Emergência” é um engano. Um suspense B, estilo Supercine, que tem até seus momentos de tensão funcionais. Fruto do talento de seu diretor, que faz uso de supercloses – para aumentar o nível de aflição, e que nunca foge da violência. Brad Anderson impressionou com o drama O Operário (2004), assinou o interessante Expresso Transiberiano (2008) e o fofo Próxima Parada Wonderland (1998), além de dirigir episódios para muitas séries de TV, como The Shield; A Escuta; Fringe; Boardwalk Emipre; Alcatraz; Person of Interest; e The Killing.
Na edição, em forma de efeito estilístico há a ajuda de freeze frames pontuais – ou pausas acrescentadas de efeitos de som, tudo para acentuar a violência e suas ações. O roteiro, peca no desenvolvimento da trama e traz um terço final inacreditável. De ruim. E, mais especificamente um horror de cena final, que deve se achar original, corajoso, mas não passa de um erro. Um dos culpados é o roteirista Richard D´Ovidio, o mesmo das bombas Rede de Corrupção (2001) e 13 Fantasmas (2001).
Elenco
E Abigail Breslin, a garotinha gordinha de Pequena Missa Sunshine (2006), que já havia demonstrado evolução em Zumbilândia (2009), cresceu de verdade. E com vontade de aparecer bem, faz com vontade uma personagem afogada em desespero que vai além do claustrofóbico, que parece até legítimo. Do outro lado da linha, a oscarizada Halle Berry começa bem no caso que dá start ao suspense, mas se perde e escorrega no trauma. Quando tenta resolver o crime então… Como acreditar que sua motivação é capaz de fazê-la tomar aquelas decisões?
O vilão de Michael Eklund é uma incógnita, negativamente. Nem a explicação doentia ajuda a compreendê-lo. Já os veterano José Zuniga (o colega na cadeira de rodas, Marco), Roma Mafia (sua chefe na central do 911) e Michael Imperioli (o homem que tenta socorre-la) cumprem tabela. Para completar, o policial (e interesse romântico) que investiga o crime é Morris Chestnut, coadjuvante mor de todo tipo de filme. Aqui, faz o mesmo de sempre e não contribui em nada com a obra.
Trote
Ah, encontrei um dado interessante. No Brasil, uma pesquisa mostra que cerca de cinco mil ligações diárias ao 190 recebe são trotes, que é considerado um crime com pena que varia desde uma multa até seis meses de prisão. E aí, quem vai pagar pelo filme, perdão, pelo trote “Chamada de Emergência”?