PIRANHA (Piranha, 1978) de Joe Dante: Um cardume de piranhas escapa de um laboratório de pesquisas científicas do exército americano e acaba num rio e num lago infestado de veranistas e crianças em férias. Agora, com a chegada de um festival aquático, uma detetive particular e um homem sem nada a perder, começam uma corrida contra o tempo para impedir que elas espalhem mais morte e horror e aumentem o banho de sangue. Produzido pelo lendário Roger Corman, revelou para o mundo o talento do diretor Joe Dante (Gremlins 1 & 2; 1984/1990) em mexer com os nervos das plateias e desde sua estreia foi considerado um clássico instantâneo dos filmes de terror e suspense.
PIRANHA II: ASSASSINAS VOADORAS (Piranha 2: The Spawning, 1981) de James Cameron: Clube Elysium, pode parecer um paraíso. Mas a poucos metros da praia, surge uma nova onda de terror que não poupa ninguém de sua fome selvagem e insaciável. Enquanto investigava a morte misteriosa de um mergulhador, a instrutora de mergulho Anne Kimbrough, faz uma descoberta arrepiante: peixes parecidos com piranhas e dotados de asas são os responsáveis pela morte do mergulhador. À medida que o número de cadáveres aumenta, Anne, desesperadamente tenta convencer o gerente do resort a cancelar a celebração anual do peixe frito na praia. Mas ele está determinado a proporcionar aos seus hóspedes um verdadeiro banquete. O filme marcou a estreia na direção de James Cameron, vencedor do Oscar de filme e direção por Titanic (1997), e que também assina Avatar (2009), e os dois primeiros O Exterminador do Futuro (1984/1991).
Existe uma noção básica para se entender o horror no cinema: compreender as ansiedades de uma época. Acessar filmes é acessar documentos de uma atualidade que imprimiu neles seus traços. Uma atualidade é uma época marcada por características filosóficas e políticas que lidam com os problemas estruturais a cerca da sociedade. E o cinema de horror, principalmente os que são considerados Filmes B, apresentam expostos à luz alguns aspectos e elementos das ansiedades do momento.
Siegfried Kracauer mostra como o Expressionismo Alemão já apresentava os primeiros sintomas, ou signos que seriam o terreno de afloramento da ideologia nazista que comandaria totalitariamente a Alemanha na segunda metade dos anos 1930 até 1945. Essa pesquisa estende a possibilidade de perceber como Filmes B dos anos 1950 e 1960 repercutiam as ameaças que a Guerra Fria produzia na sociedade estadunidense. Podemos citar aqui os filmes de ficção científica sobre invasões alienígenas ou mesmo os zumbis, que eram humanos que agiam feitos animais por serem alienados de si mesmo. Estas reflexões são absolutamente importantes para se ter a noção da atmosfera que existe em um momento e o que ela pode gestar a partir de uma perspectiva política. Mas como um Filme B pode trazer tanta reflexão?
Em princípio, o pilar fundamental de um Filme B é sua potencialidade popularesca. Lembremos que o cinema surge como espetáculo exibido em feiras populares, tendo como seu primeiro público nos fins do século XIX, o operariado proletário. O que mais se buscava era divertir aquelas pessoas, entreter, mexer com seu humor e suas ansiedades. Brincavam com suas potências e seus desejos, diriam os psicanalistas. Portanto, o espetáculo é um elemento do cinema acessível e popular que os exibidores daquela época e os produtores contemporâneos de Hollywood buscam. No caso do cinema de Filmes B, o espetáculo que eles buscam não se envergonha de suas soluções criativas, ou não, e de sua busca em interagir afetivamente – sendo caricata ou não – com seu público, que está ou não afundado em preocupação. Esses Filmes B não se preocupam em constituir narrativas rasas e sem exigir muita reflexão, estabelecendo uma comunicação imediata, de forma direta com quem está assistindo. E é dessa maneira que os traços de uma época se expõem a luz do dia. Elas boiam nas superfícies das águas rasas, interagindo com as subjetividades mais a flor da pele de sua audiência.
Piranha é uma franquia que se tornou clássica, que se configura bem no chamado Trash Movie, mas cult. Seus dois diretores – Joe Dante, no primeiro e James Cameron, no segundo – se tornaram referências em seus campos de atuação. Joe Dante se tornou um diretor que levou muita gente ao cinema com filmes como Gremlins e Gritos de Horror. Seu cinema se tornou clássico no gênero e era visto como uma grande oportunidade para vender pipoca e se divertir, sentir medo e rir, ao mesmo tempo. Já James Cameron dispensa apresentações, mas vamos fazê-la de forma resumida. Após realizar seu primeiro filme, Piranhas 2, sua carreira só fez crescer. Escreveu e dirigiu O Exterminador do Futuro (1984), Aliens – O Resgate (1986), e mais pra frente venceu o Oscar com o épico Titanic (1997). Porém, ambos os diretores possuem em seus currículos, o início de sua navegação no cinema de Filmes B.
O primeiro filme da franquia, Piranha (1978), se inicia com a busca por um casal de adolescentes que invadiu um espaço restrito e resolveu tomar banho em um tanque que continha peixes mutantes carnívoros. Acidentalmente, o casal que procuravam esses adolescentes liberam esses peixes no rio que banha a região e é lugar de entretenimento de muitos. Agora, eles terão que resolver esse problema, uma vez que está no auge do verão americano e as pessoas estão utilizando o rio para se divertir. Em Piranhas II: Assassinas Voadoras (1981), a ameaça volta ainda mais sinistra e fantasiosa. Se elas eram mutantes que atacavam e comiam as pessoas que estavam nadando no rio, agora, elas estão no mar e, pior, elas desenvolveram asas e voam, provocando uma carnificina em um resort de turistas idiotizados e adolescentes que buscam uma única coisa: sexo.
O absurdo quase cômico recheiam essas obras. Mas essa construção caricata que buscou aproveitar o sucesso estrondoso de Tubarão (1975), de Steven Spielberg, traz em suas veias elementos importantes que atravessavam as sociedades ocidentais envoltas na Guerra Fria. Observando essas duas obras, percebemos de antemão dois elementos fundamentais: o animal como força da natureza que ameaça a normalidade e a diversão dos turistas; e os efeitos da intromissão da humanidade na natureza com os experimentos científicos desenvolvidos nos períodos de Guerra e que buscava produzir armas para atacar os inimigos.
Conspiração, projetos secretos e acidentes que atingiam diretamente os cidadãos que estavam ali em volta eram motivos de desconfiança que afetavam as subjetividades dos indivíduos daquela cultura naquele tempo. Na tentativa de criar uma arma biológica, o governo dos EUA investiu na criação de um monstro mutante que acabasse com os inimigos e seu sistema ecológico. Porém, isso foge do controle e é essa perda do controle e suas consequências que são fatores fundamentais para o medo da plateia que assiste. Tentativa de controle da natureza, Guerra, descontrole, monstruosidade misturada com mto sangue e pessoas sem moralidades são a receita desses dois filmes.
Essa é a premissa da franquia Piranha, dois filmes escanteados e que hoje já ganharam remake e continuação, e que se tornaram cult exatamente por sua carga histórica como um documento de uma época e, obviamente, como obras de dois grandes nomes do cinema estadunidense, relançados pela Classicline e distribuido para os assinantes da Clube Box, na edição cujo o tema é Locadora Sinistra. Aproveitem e divirtam-se com esses dois clássicos do cinema.