Birdman (ou A Inesperada Virtude da Ignorância) | (Birdman – or the unexpected virtue of ignorance, 2014) de Alejandro Gonzáles Iñarritu
Quem sou eu para rotular uma obra (prima) tão peculiar e genial? Sem espaço para respirar, a trama segue o ator Riggan Thomson (Michael Keaton, com uma capacidade de entrega incrível), que 22 anos após interpretar um super-herói do cinema, decide montar uma produção na Broadway. A aposta é somente a sua carreira, hoje estagnada.
No processo criativo, Riggan tem de lidar com seu alter-ego (Birdman), um ótimo, mas problemático ator (Edward Norton, excepcional), sua namorada que pode estar grávida (Andrea Riseborough), sua filha e assistente (Emma Stone) – que saiu de uma clínica de reabilitação, seu agente (Zack Galifianackis), sua ex-mulher (Amy Ryan), uma estrela insegura (Naomi Watts) e uma crítica de teatro que deseja enterrar sua carreira.
Obra complexa, é uma crítica criativa contra grande mercado de Hollywood, seus filmes pipoca e astros de ego inflamados. Ecos de Cisne Negro (2011), uma edição que faz de conta que o filme é um plano sequência só, solos de bateria e um elenco inflamado em talento com suas cenas-chave. Como esquecer da voltinha na Times Square de cuecas? O que é real e o que é irreal? Uma linha tênue entre a sanidade e a insanidade humana transborda na tela. Uma obra ambiciosa, mas que funciona em todas as suas apostas geniais.
Indicações: filme, diretor, roteiro original, ator (Michael Keaton), ator coadjuvante (Edward Norton), atriz coadjuvante (Emma Stone), fotografia, edição de som e som.
A Teoria de Tudo (The Theory of Everything, 2014) de James Marsh
Baseado no livro ‘Minha Vida com Stephen’ de Jane Hawking, o drama foca mais na vida universitária do físico Stephen Hawking (Eddie Redmayne), mais especificamente em seu namoro e depois casamento com Jane (Felicity Jones, excelente). Em meio às suas pesquisas/estudos e a construção de uma família, há a descoberta de sua doença degenerativa, esclerose lateral amiotrófica, na época chamada de síndrome do neurônio motor.
Todos os elementos que o Oscar ama amar estão aqui. O drama é baseado em história real, e na vida de uma personalidade respeitada e ainda viva, e em uma condição de saúde bem específica. Recontada em tom de sessão da tarde, o bônus é Eddie Redmayne em um “tour de force”, com todos os acessórios/muletas possíveis. Dificuldade na fala, locomoção, entrega emocional e drama familiar. Tudo junto num mesmo pacote. Um filme bonitinho, e que deve brigar pela estatueta de melhor ator e trilha sonora. O resto, vamos esquecer.
Indicações: filme, ator (Eddie Redmayne), atriz (Felicity Jones), roteiro adaptado e trilha sonora.
Por Filipe Quintans
Whiplash – Em Busca da Perfeição (Whiplash, 2014) de Damien Chazelle
Entre os indicados a melhor filme no Oscar 2015, Whiplash é aquele do qual se espera, desde o primeiro minuto na tela, uma lição de moral. O atrito entre talento selvagem e rigor acadêmico, no caso entre um promissor baterista e o equivalente musical do sargento-instrutor de Nascido para Matar (1987), sugere que um ensinamento está a caminho. O problema é que ele nunca chega.
E pior: em seu lugar, uma bravata proverbial digna de montagem fotográfica compartilhada pela sua mãe no Facebook. “A pior coisa que você pode dizer a um jovem é ‘bom trabalho'”, diz o maestro interpretado por J.K. Simmons. Grandes artistas, e o baterista interpretado por Miles Teller se trata de um jovem grande artista, não se deixam levar por um ‘bom trabalho’ banal e besta.
Mero figurante na disputa pelo prêmio principal da Academia, Whiplash será surpresa se premiado entre as principais categorias, mas deve levar o Oscar de coadjuvante para o “mestre” J.K. Simmons.
Indicações: filme, roteiro adaptado, ator coadjuvante (J.K. Simmons), montagem e edição de som.
Selma – Uma Luta Pela Igualdade (Selma, 2014) de Ava DuVernay
Não será surpresa, no entanto, se Selma, a tão bem cuidada e bem falada reconstrução da marcha organizada e liderada pelo pastor Martin Luther King entre as cidades de Montgomery e Selma, no Alabama, em abril de 1965, sair da cerimônia como melhor filme. O Oscar de canção original (“Glory” de Common e John Legend) é barbada.
Ava DuVernay, diretora do filme, amparada na produção de Oprah Winfrey e Brad Pitt, tem dois feitos a seu favor, ou melhor, dois achados: um protagonista soberbo (David Oyelowo) e um ângulo preciso – mesmo que essa precisão o torne excessivamente didático (a conturbada vida pessoal de Luther King inexiste).
À luz dos acontecimentos em Ferguson e demais cidades americanas (e brasileiras, cotidianamente), a “questão racial” de Selma se adensa: a marcha, parte de um grande esforço para garantir o voto livre e independente de cor, raça etc., foi mais do que uma oportunidade para uma boa ação, um discurso memorável e um feriado (nos EU);. A Academia, majoritariamente masculina e branca, talvez, se sensibilize. Deveria, ao menos.
Indicações: melhor filme e canção original (“Glory” de Common e John Legend).
O Grande Hotel Budapeste (The Grand Hotel Budapest, 2014) de Wes Anderson
Maldade dizer que Wes Anderson faz filmes infantis para adultos ou que sua obra ressoa mais alto entre o público intelecto-hipster-cinema-de-arte. Aos 45 anos, dentes afiados em início de carreira no cinema independente, experimenta com fortes paletas de cores, toma influências e lições da nouvelle vague e do cinema de autor (Godard, sobretudo). Em Grande Hotel Budapeste, sete filmes de longa metragem depois, Anderson encontrou a maturidade cinematográfica utilizando técnicas narrativas sofisticadas, diálogos dados ao monossilabismo e uma tela/espelho que mais parece uma carta de baralho.
Vencedor do Globos de Ouro de melhor filme (comédia ou musical), além de arrecadar $174 milhões de dólares no mundo todo, ‘Budapeste’ é reconhecido como o “filme de arte”, no sentido mais literal possível, dentre os indicados ao prêmio máximo do domingo próximo. Desafeito ao holofote, concentrado no texto e na textura do que leva à tela, Wes Anderson talvez tenha feito mais por merecer que seus concorrentes.
Indicações: filme, diretor, roteiro original, fotografia, montagem, trilha sonora, design de produção, figurinos e maquiagem & cabelos.
Por Thiago Sampaio
Boyhood – Da Infância à Juventude (Boyhood, 2014) de Richard Linklater
Mais do que filme, o drama trata-se de um experimento cinematográfico. Não à toa, foram necessários 12 anos de filmagem, captando com a maior fidelidade possível, o processo de envelhecimento dos atores, para narrar a história do garoto Mason (Ellar Coltrane) e sua relação com os pais divorciados (Ethan Hawke e Patricia Arquette, magníficos!) durante as diferentes fases das vida. Alternando momentos tristes e outros divertidos, o diretor Richard Linklater aborda tal trajetória de uma maneira bem leve e natural… Assim como a vida!
Da mesma forma que o próprio Linklater já havia feito na impecável trilogia Antes do Amanhecer (1995), Antes do Pôr-do-Sol (2004) e Antes da Meia-Noite (2013), os diálogos soam tão naturais, quase convencendo o expectador que não há um roteiro ali, parecendo improvisos dos atores. Captando com fidelidade aspectos de cada época (desde a trilha-sonora que vai de Coldplay à The Black Keys, passando por referências de filmes), já que o longa-metragem fora filmado durante pequenos intervalos na agenda da equipe entre os anos de 2002 e 2014, Boyhood não é apenas a “história sobre o crescimento de um garoto”, mas algo único sob o ponto de vista de um cineasta visionário.
Indicações: filme, diretor, roteiro original, ator coadjuvante (Ethan Hawke), atriz coadjuvante (Patricia Arquette) e montagem.
O Jogo da Imitação (The Imitation Game, 2014) de Morten Tyldum
Cinebiografia do matemático Alan Turing (Benedict Cumberbatch), que durante a Segunda Guerra Mundial lidera uma equipe montada pelo governo britânico com o objetivo de quebrar o Enigma, código usados pelos alemães para enviar mensagens aos submarinos. Interessante por apresentar um episódio conhecido popularmente apenas de maneira superficial, o drama dirigido por Morten Tyldum capta bem o clima de tensão do período, os preconceitos que na época se misturavam com as próprias leis, e, principalmente, por apresentar uma figura tão icônica como Alan Turing.
E justamente por ser uma personalidade tão peculiar, a excelente interpretação de Benedict Cumberbatch acaba por ter um destaque maior do que o próprio filme em si. O ator encarna um homem convencido de sua genialidade, extremamente anti-social e arrogante com os outros ao seu redor (uma espécie de Sheldon Cooper do seriado “The Big Bang Theory” com veia dramática), mas que carrega consigo uma insegurança desde a infância. Assim, “O Jogo da Imitação” se torna um bom filme sobre Alan Turing, e não sobre o Enigma, perdendo a chance de abordar mais momentos de dramas ocasionados por uma guerra, como a recusa em salvar o irmão de um amigo em prol das ambições em torno das próprias descobertas.
Indicações: filme, direção, ator (Benedict Cumberbatch), atriz coadjuvante (Keira Knightley), roteiro adaptado, montagem, trilha sonora e design de produção.
Sniper Americano (American Sniper, 2014) de Clint Eastwood
Quando se trata de fazer filmes para evocar o patriotismo, poucos conseguem fazer de maneira tão convincente quanto Clint Eastwood. E isso não é simplesmente porque o diretor alcançou tal objetivo em “Sniper Americano”, filme que está indicado ao Oscar e que conta a história do atirador mais letal da história dos Estados Unidos. Vale lembrar que Eastwood conseguiu evocar esse tipo de sentimento também em “Invictus”, um longa que pode servir de exemplo para muito do que se ver em cena neste seu recente trabalho.
Chris Kyle (Bradley Cooper) vivia uma vida normal no Texas até ver uma embaixada americana ser atacada em uma notícia na TV e decide se alistar ao exército, no batalhão SEAL. É aí que começa a história de um homem que deixou de lado a resignação de uma vida que poderia ser encarada como medíocre para se tornar uma lenda e um herói.
E de tanto nos colocar frente a esse herói, Clint Eastwood restringe a sua visão de mundo e, principalmente, política. Republicano e patriota mais do que confesso, o diretor “esquece-se” dos elementos políticos que são cruciais para entender a guerra, compreender o conflito e refletir sobre ele. Aliás, reflexão é uma palavra inexistente no filme. Se nada refletimos sobre os conflitos da guerra em si, também não existe nada que reflita nos conflitos do próprio personagem, já que apenas sabemos que ele foi consumido pela guerra e o seu desejo de defender o país e lutar por ele são suficientes para explicar tudo – o que é uma pena.
No entanto, há de se reverenciar a boa condução de Eastwood em criar situações de tensão – as sequências de arrombamentos são um exemplo disso, assim como uma outra que se passa numa tempestade de areia. E por mais que a obra sofra de problemas para contextualizar a sua história – e ainda por cima nos apresenta um vilão desnecessário quando o verdadeiro vilão está bem à nossa frente – o longa dirigido por Eastwood tem as suas virtudes mas esbarra no culto a um herói em uma guerra que trouxe tantos danos, não somente aos EUA, mas para todo o mundo.
Indicações: filme, ator (Bradley Cooper), roteiro adaptado, montagem, edição de som e som.
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