Assitir à SENNA (Netflix) Foi como voltar ao passado. Uma viagem que passeava pelos anos 80 e 90 que tanto eu vivi frente à TV, vendo as corridas de Fórmula 1 ao lado do meu pai. Desde pequenino, vibrava com as ultrapassagens, clima de competição ferrenha e muita rivalidade entre alguns dos pilotos do grid. Mas tenho de confessar que, durante a construção do ídolo nacional “Ayrton Senna”, eu não era exatamente um fã do piloto.
O “Tema da Vitória” não veio com ele, já havia sido tocado antes, mas tenho de admitir que suas vitórias eram muito mais emblemáticas do que a de qualquer outro piloto. A vontade de vencer sucumbia às suas dificuldades. Seja em um carro menos competitivo, ou mesmo manobras políticas dentro da Federação Internacional de Automobilismo (FIA).
E tudo isso que “vivi” pela televisão, não é apenas resgatado em SENNA (direção geral de Vicente Amorim e co-dirigido por Júlia Rezende), mas ampliado com uma série de narrativas íntimas, histórias de bastidores, e claro, o olhar familiar para com ‘Deco”, apelido de infância do piloto brasileiro, considerado um dos melhores pilotos de automobilismo de todos os tempos.
A produção, assinada por Fabiano Gullane e Caio Gullane, em parceria com a Netflix, é monumental, e inclui colaboração ativa da família do piloto no seu desenvolvimento. Em formato de minissérie, SENNA reconta em seis episódios a história de Ayrton Senna da Silva, herói brasileiro dentro e fora das pistas da Fórmula 1. Sua trajetória é revista apontando para um olhar intimista, tanto como piloto quanto como ser humano. A trama vai desde suas primeiras voltas em um kart, e se desenvolve junto com a sua carreira automobilística, da Fórmula Ford até o trágico acidente que tirou sua vida e deixou um país inteiro de luto, em 1994.
Dramaticamente, Gabriel Leone entrega um Senna entre nuances de fala, olhar e movimentos calculados, apostando e acertando no menos é mais. Contexto histórico tem reprodução nostálgica em programas de TV, produtos, patrocinadores, trilha sonora e fatos históricos como pano de fundo. Inclusive, sua reconstituição histórica, desenho de produção e figurinos são muito bem cuidados.
Com muitos personagens circulando no enredo, escolheram “apresentá-los” pontuando visualmente quando entram em cena. É uma decisão okay, funcional, principalmente para os pouco acostumados com as figuras que circulam o mundo do automobilismo, e que funcionam mais ainda pelas semelhanças físicas. E chegando ao ponto mais impactante, as cenas de ação. Na pista, as sequências de ação me impressionaram muito, a ponto de relembrar o realismo e adrenalina de Grand Prix (1966) e Rush – No Limite da Emoção (2013), até então tido como as produções mais realistas das pistas.
Para minha total surpresa, partte das sequências das corridas, mais especificamente os dois lendários GPs de Mônaco (de 1984 e 1988), foram totalmente totalmente recriadas em CGI (computação gráfica). Liderada pelos diretores Cássio Braga e Carlos Kulpa, o trabalho do studio Miagui levou cerca de um ano para ser concluído e reuniu um time de cerca de 60 artistas brasileiros de diversas áreas. E por falar em números, cerca de 15 mil figurantes estiveram nas gravações de toda a minissérie, dando mais autenticidade ao clima das corridas.
Segundo os produtores, a equipe de VFX optou por recriar o Principado de Mônaco em CGI, com o objetivo de executar as cenas com maior liberdade criativa, mas sem abrir mão da fidelidade histórica e da realidade das cenas. Além de todo o cenário, reconstruiu digitalmente em detalhes mais de 120 prédios que rodeiam o circuito, mais de 10 carros, assim como seus respectivos pilotos, foram totalmente gerados em computação gráfica nos mínimos detalhes, a partir de referências fotográficas e scans feitos a partir dos protótipos usados em pista. Já para animar as corridas, foi necessário estudar as coreografias dos carros, ultrapassagens, pontos de vista da pista, detalhes das curvas e até mesmo os acidentes, para posteriormente recriar digitalmente cada momento-chave da história vivida pelos pilotos dentro das pistas.
Para finalizar e voltando ao começo do texto, rever na tela não apenas as corridas, mas os detalhes privados da vida de Ayrton Senna, como as discussões internas com a equipe, sua rivalidade com Senna, seu romance com Xuxa (a semelhança física assusta, de tão idêntica), a relação com a família e a criação do Instituto que leva seu nome, tudo muito redondo e que me fez se tornar um fã e se emocionar muito com a sua história. SENNA é emocionante e imperdível.
“Nós, entediados de sermos quem somos, precisamos de um lugar para não sermos ninguém.” (Ayton Senna)