Batman (The Batman, 2022) de Matt Reeves
Já quero adiantar que, diante de tanta pressão pós trilogia de Christopher Nolan (Batman Begins – 2005; O Cavaleiro das Trevas – 2008; O Cavaleiro das Trevas Ressurge – 2012), essa releitura, dos quadrinhos para o Cinema, de Batman funciona. Bem verdade que exagera no tom grandioso em que se coloca, mas acerta em narrativa crível e trama essencialmente investigativa. O novo Batman (The Batman, 2022) apresenta o Homem-Morcego em seu segundo ano de ação em Gotham como um vigilante. E a grande questão é que ele não é um herói, nem parece querer ser visto como, ele se autodenomina “vingança”, com ódio e tristeza refletidas em seus olhos, seja mascarado ou na pela de Bruce Wayne (Robert Pattinson).
Como diz a canção do Nirvana que emoldura o vingador mascarado de Gotham, tem “Alguma Coisa No Caminho” (Something in the way). Numa fotografia tingida de sombras, e uma música que pulsa sem cessar, como se pedisse pra gente não respirar um minuto – artimanha que, por isso mesmo, me incomoda muito – somos jogados numa trama que inicia com uma narração em off e clima noir. Mas essa escolha narrativa só dura a abertura, com o off só voltando nos minutos finais da trama. O que me parece é que essa escolha destoa de todo o miolo do longo longa do diretor Matt Reeves.
Responsável não apenas pela direção, Reeves também é produtor e co-assina o roteiro da obra que parece beber muito nos filmes policiais de Michael Mann e David Fincher, principalmente em Zodíaco (2007). Das pistas deixadas pelo caminho, ao visual urbano de “Charada” (Paul Dano, no ponto certo entre a loucura e a perspicácia), o filme é calcado na incessante investigação de Batman, a cada passo, um avanço nas entranhas criminosas que envolvem a polícia e mafiosos, abuso de poder, corrupção e política. O que o leva ao encontro de Oswald Cobblepot/Pinguim (Colin Farrell, tão irreconhecível quanto estupendo), Carmine Falcone (John Turturro), e Seline Kyle/Mulher-Gato (Zoë Kravitz, instigante), enquanto ao seu lado estão Alfred Pennyworth (Andy Serkis) e o tenente James Gordon (Jeffrey Wright, numa persona que fica algo entre o abatido e o raivoso).
Mas voltando ao olhar do realizador, Matt Reeves imprime em suas sequências um peso que segue seu visual extremamente escuro, tão duro que por vezes chega a ser estafante, e até triste também, só para não esquecer a canção do Nirvana que ele escolheu. Exceto por seu filme de estreia – a comédia dramática O Primeiro Amor de um Homem (1996) – , seu histórico fala por si, e justifica suas escolhas. Cloverfield: Monstro (2008), um founded-footage de monstros exasperante; um remake interessante em Deixe-me Entrar (2010); e os dois últimos capítulos do reinício da saga de O Planeta dos Macacos: O Confronto (2014) e A Guerra (2017).
E para quem tinha dúvidas se Robert Pattinson seguraria a onda, pode-se dizer que ele se sai bem melhor por trás da máscara, do que sem ela. Consumido pela dor, seu Bruce Wayne não se compromete, fato. Mas o peso da “vingança” do ser Batman é bem melhor. Até mesmo quando se dá conta da mudança de perspectiva do protagonista.
Em se tratando de uma nova adaptação dos quadrinhos de Batman (criado por Bob Kane e Bill Finger), o que temos aqui é um filme corajoso, mas também prepotente muitas vezes. Tudo é em larga escala, até um simples caminhar do Morcegão em meio à uma investigação, ou dentro de uma delegacia apinhada de policiais. Tudo isso depõe tanto a favor quanto contra a superprodução, inclusive, é impossível não comparar Matt Reeves às vezes com Burton (em 1992 o seu Batman – O Retorno traziam Pinguim e Mulher-Gato como vilões), às veze com Nolan (em 2012 o seu último Batman tinha Mulher-Gato também), mas sempre tentando fazer seu próprio caminho. Funciona como um produto bem acabado, tanto para apresentar o personagem icônico às novas gerações, além de mostrar um novo rumo aos já iniciados, em um universo não compartilhado com nenhuma outra produção da DC Comics, mas que flerta bem com o último Coringa (2018), batendo muito com sua abordagem realista.
Ao final de quase três horas de duração, eu não me maravilhei com o novo Batman. Mas acredito que a superprodução de Matt Reeves foi feita para ser percebida como um épico deslumbrante, cheio de cenas grandiosas. Por isso mesmo deve tocar forte o coraçãozinho dos fãs fervorosos de “filmes de boneco”, principalmente os que estavam sentindo falta do Homem-Morcego na tela grande. Para mim, somente um bom filme policial investigativo, sem deslumbre. E com mote aberto para uma continuação.