Cine Marrocos (2021) de Ricardo Calil
Vencedor do festival É Tudo Verdade de2019, o documentário Cine Marrocos explora o experimental e lúdico para contar uma narrativa de pertencimento. Mais do que tudo, o longa é exercício onde a metalinguagem expõe inúmeras dicotomias que não afetam apenas o cinema, mas a vida real.
O Cine Marrocos foi um glorioso cinema brasileiro, e que já fora considerado o mais luxuoso da América do Sul. Desativado, é ocupado por dois mil sem tetos de 17 países diferentes. O Longa, gravado em 2015, propõe, enquanto investiga a vida de alguns desses moradores, uma oficina de teatro para que os ocupantes recriem algumas cenas famosas da história do cinema de películas que foram vistas anos atrás no auge do Cine Marrocos.
O diretor Ricardo Calil (Os Arrependidos, Narciso em Férias, Uma Noite em 67), constrói uma narrativa que experimenta nas dicotomias. Passado e presente se fundem para contar uma história sobre pertencimento. Cinema é para todos, para todas as classes sociais. Interpretar filmes clássicos dar tanto aos moradores e ao espectador essa sensação onde as desigualdades sociais podem ser enfrentadas por meio da arte.
Os ocupantes do Cine Marrocos são entrevistados e diversos motivos os levaram a estarem ali. Temos inúmeras histórias diferentes que são unidas pela dor, seja de abandono a uma fuga. A Oficina de Teatro é o ambiente de união onde interpretando grandes astros de filmes clássicos os moradores ocupam suas vidas de outras formas. A Metalinguagem de ocupação real e simbólica do cinema é construído com os moradores sendo os protagonistas do filme.
Vários filmes são interpretados pela oficina, desde “O Crepúsculo dos Deuses”, de Billy Wilder, “A Grande Ilusão”, de Jean Renoir, “Júlio César”, de Joseph L. Mankiewicz, “Noites de Circo”, de Ingmar Bergman, e “Pão, Amor e Fantasia”, de Luigi Comencini. O mais interessante é como cada participante dar nova cara a cena interpretada não sendo apenas uma cópia do original.
Os únicos deslizes do longa é não explorar o macro de sua história. Em quase 1h20 de filme pouco temos relação de como comunidade do cinema enxerga a oficina. Além da desapropriação dos moradores que mostrado de forma muito abrupta.
Cine Marrocos é filme lúdico e realista. Através de uma observação intervenção artística vemos dicotomias saltarem a tela. Ocupação do real e simbólico em exercício de metalinguagem que Calil conduz com os ocupantes que nos geram inúmeras reflexão sobre a arte e a vida.