Sam Raimi é um cara criativo, inquieto. Diretor e roteirista da trilogia A Morte do Demônio (1983; 1987; 1993) – também conhecido como Uma Noite Alucinante, uma série cult que começou como puro terror no primeiro, flertou com o nuances cômicos no segundo e acabou em comédia (em tom sombrio) no terceiro.
Mas para o grande público, seu maior feito é o de ser responsável pela (boa) adaptação da primeira trilogia do Homem-Aranha (2002; 2004; 2007) no cinema. O primeiro resultou num filme colorido e que se saiu bem, depois veio com um segundo capítulo espetacular e, bem, um terceiro que prefiro esquecer. Mas, em termos de bilheteria, é uma das séries mais bem sucedidas do cinema.
Entre uma e outra trilogia fez um western bacanudo (Rápida e Mortal, 1995), enveredou pelo drama (tenso) com o sensacional Um Plano Simples (1998), fez um romance de encomenda (Por Amor, 99) e um suspense interessante (O Dom da Premonição, 2000). Criou também um herói digno de HQs em Darkman – Vingança Sem Rosto (1990) e trouxe de volta o clima de suspense retrô no divertido Arraste-me para o Inferno (2009). Mas apesar de acertos artísticos, nenhum deles fez muito dinheiro.
Mas será que todo seu currículo o faz capaz de revisitar o universo de um clássico e criar para o tal uma pré-continuação? Pela sua inventividade eu diria que sim, mas há muito mais que cinema no mundo do cinema.
O produto traz a chancela Disney, um orçamento de mais de 200 U$ milhões e carrega uma vontade do estúdio de fazer mais e mais continuações. Após conferir o (pífio) resultado final, temos duas explicações possíveis: Ou Raimi foi tolhido de decisões finais ou durante a produção passou por uma grave ausência de energia criativa.
A aventura em questão é Oz: Mágico e Poderoso (Oz The Great and Powerful), que conta a história de Oz, anos antes do período em que se passa o clássico O Mágico de Oz (1939). O novo Oz é uma desilusão que só não é mais insignificante porque o seu visual berra em cores, efeitos, sons e movimentos que existe. E muito.
Você não está mais no Kansas
Acompanhamos aqui a história de Oscar Diggs (James Franco) – vulgo Oz, que depois de um furacão em Kansas vai parar na Terra de Oz. Lá se depara com três bruxas, Theodora (Mila Kunis), Evanora (Rachel Weisz) e Glinda (Michelle Williams), cada uma com uma história diferente e sem saber qual delas é a verdadeira vilã. Sua chegada à Oz traz de volta a esperança da concretização de uma antiga profecia, a qual um mágico poderoso libertará a cidade do mal.
Bom de lábia com as mulheres, mas um mágico de quinta, o personagem Oz é a verdadeira personificação ao avesso da obra em si. Ele sonha em ser grandioso e é recebido em Oz como a própria esperança. Em imagens, a aventura é grandiosa, mas de forma estéril, sem tutano para criar uma fagulha sequer de sentimento. Não consegui enxergar esperança nenhuma e o longa, que tem pouco mais de duas horas, parece ser interminável. É uma colagem de indiferenças, sem emoção, tensão, sensibilidade, romance ou empolgação.
O tédio ganha de longe e só é perturbado com algumas doses cômicas, quase sempre com um humor infantil em demasia. A trilha sonora de Danny Elfman se faz presente na abertura, mas depois simplesmente desaparece ao se tornar uma espécie de mashup de tudo que já fez, mas de forma insípida.
O Mágico de Oz
São várias as referências ao musical O Mágico de Oz (1939). Do prólogo, também em P&B – que até injeta um pouco de expectativa artística, para em seguida mergulhar num excesso de marasmo em cores – à caracterização dos personagens, fantasiosamente caricatos. Principalmente a bruxa má do oeste, de pele verde, nariz e queixo pontudo, composta de verruga, chapéu e claro, anda de vassoura.
O design de produção – quando milagrosamente não é CGI – aposta do visual retrô e cores vibrantes, com destaque para as indefectíveis estrada de tijolos amarelos e a cidade das esmeraldas. Há ainda a inserção de um leão, espantalhos, um passeio de bolha de sabão, o poder das papoulas e um furacão. Mas também vem da necessidade enorme de criar laços com o passado o ponto baixo da homenagem. O fundo do poço se dá na aparição dos Munchkins, anões alegres e que vivem cantando, numa cena musical completamente deslocada de todo o filme. Afinal, é referência ou reverência?
Se já é preocupante quando existe maior destaque para os sidekicks (ou parceiros de ação) do que ao protagonista, o que dizer de um mico alado engraçadinho e uma garota de porcelana inexpressiva roubarem a cena do protagonista Oz? Incompreensível. Seus companheiros de jornada se destacam pelos motivos errados: o tom cômico das situações, também conhecido como apelação. E só.
Elenco
James Franco já provou versatilidade tanto numa comédia desbocada (Segurando as Pontas), quanto em drama intenso (Milk – A Voz da Igualdade) – ambos de 2008, passando por uma tour de force que lhe valeu uma indicação ao Oscar de melhor ator (127 Horas, de 2010). Já aqui, demonstra zero carisma e uma grande vontade de forçar a barra no quesito malandragem, inexistente. E apesar de repetir em seus números a frase “basta que você acredite”, tanto personagem quanto filme não fazem por onde. Além disso, as motivações são forçosamente um entulho de clichês, e como parte essencial da trama, o protagonista deveria ser inspiração para uma cidade, mas o resultado não é nada inspirador.
Do lado das bruxas a situação melhora um pouco. O tom agridoce impregnado por Michelle Williams faz da bruxa Glinda, a bondade em forma de gente. Mila Kunis surpreende na mudança de comportamento – de amor para ódio, apesar de a motivação parecer banal demais para uma bruxa, dita, poderosa. Rachel Weisz equilibra poder e ambuiguidade com categoria e não se compromete.
Resultado final
Ao final, a impressão que se tem é de que a história não se move pela história e sim nas tentativas de fazer com o visual seja algo espetaculoso, gritando em cores e efeitos especiais. O espetáculo inexiste e nem no uso do 3D, que tem seus momentos, não impressiona o suficiente.
O correto uso do efeito 3D deve ser o de acrescentar profundidade a cena, aliado a trama do filme o efeito deve fazer com que o espectador se veja imersivamente dentro da história, criando uma conexão não apenas funcional ou de simples efeito, mas também emocional. O uso mais simples do 3D se dá quando objetos são arremessados ao espectador, tentando criar um efeito de medo ou mexer com o público.
E, bem, Oz: Mágico e Poderoso não é nada profundo, imersivo nem tampouco cria uma conexão emocional. Do universo criado pelo escritor L. Frank Baum, resta apenas um show de horrores.