O espaço é conhecido como a última fronteira do homem. O cinema já o desbravou e cravou em sua história a obra essencial de Stanley Kubrick, 2001 – Uma Odisseia no Espaço (2001: A Space Odyssey, 1968). Robert Zemeckis sintetizou a saga Cosmos – de Carl Sagan – na pequena grande obra-prima Contato (Contact, 1997) ao tecer um belo relacionamento de proximidade entre pai e filha através do tempo e espaço. Mais recentemente, Alfonso Cuarón entrou para a história do cinema com Gravidade (Gravity, 2013), de forma simples e perfeita, ao mostrar o renascimento humano empregado não apenas com o apuro técnico, mas dramaticamente poderoso e humano.
Por isso, ir até o espaço novamente e ter a chance de dizer algo substancial, não dava para ser um cineasta qualquer.
Diretor que construiu carreira de forma sólida em Hollywood, Christopher Nolan chegou a um estágio em que pode dirigir a produção que quiser, sem interferência do estúdio, e com orçamentos polpudos. Mas para chegar até aqui ele talhou seu nome com produções que conseguem imprimir inteligência e diversão ao mesmo tempo. Mesmo que em alguns casos tenha de ser extremamente auto-explicativo.
De forma adulta e realista, assumiu o desafio de reescrever e dirigir a história de Batman no novo século com Begins (2005), O Cavaleiro das Trevas (2008) e O Cavaleiro das Trevas Ressurge (2012). Entre eles fez questão de destruir a mente do espectador com dois belíssimos quebra-cabeças, O Grande Truque (2006) e A Origem (2010).
Interestelar
E depois desse périplo podemos chegar até Interestelar (Interestellar, 2014), co-escrito e dirigido por Christopher Nolan. Quando Alien (de Ridley Scott) foi lançado em 1979, a publicidade alertava que o seu grito não pode ser ouvido no espaço. Já Interestelar é um pedido de socorro através do tempo e espaço. Num futuro que parece ser não muito distante, a Terra padece com seus recursos se esgotando. O mundo é feito de muita poeira e pouca esperança. É com esse cenário que Nolan tenta plantar seus conceitos de esperança e amor.
A possibilidade da vida reside numa missão da Nasa onde um grupo de exploradores comandada pelo ex-astronauta (Matthew McConaughey). Após uma série de contratempos, sua última possibilidade reside em usar um buraco negro recém-descoberto para superar as limitações de viagem espacial e alcançar o limite interestelar do tempo e espaço.
Se para você leitor, se faz necessário uma escrita expositiva, para ter um mínimo de tato do que a obra pode parecer, imagine que na tela, o roteiro abusa das explicações técnicas. Algumas resoluções são tão rápidas – como a escolha do ex-astronauta para a missão de emergência – e outras passam por grandes explicações.
Existe um núcleo no espaço e seus problemas técnicos – no planeta tomado pela água é algo além do espetacular – e emocionais, esses mais latentes na Terra. A família do astronauta é o elo e motivação para a missão, mais especificamente pela relação com a filha, Murphy (Mackenzie Foy mais jovem e depois Jessica Chastain). Para surpresa (e flerte/homenagem com 2001), o personagem que mais tem senso de humor na ficção é um robô, batizado de TARS.
Elenco
As presenças de Anne Hathaway e Jessica Chastain apresentam atuações robustas, que se inserem bem com a entrega emocional de Matthew McConaughey. Michale Caine bate ponto como o diretor da Nasa, Matt Damon é um surpresa negativa e não adiciona nada além de um rosto conhecido para uma situação específica.
Christopher Nolan
Christopher Nolan flerta com a megalomania ao encerrar a fita uns 30 a 40 minutos além do necessário. Se toda a pretensão do cineasta fosse vertida para a qualidade do filme, a coragem o teria feito acabar seu filme na tal 5ª dimensão do tempo/espaço. E pronto. Mas não, somos obrigados a engolir uma baboseira sem fim, da qual a fita ensaia terminar umas duas outras vezes, para aportar num mar de mensagens cifradas pelo bem maior da humanidade e uma sensação de amor eternizado no espaço.
Sua direção oscila muito, há cenas emocionais, cenas de ação (tem até dois astronautas saindo no braço, em outro planeta), mas também um excesso de cenas fechadas, onde – quase sempre – não se sabe o que está acontecendo essencialmente no filme. E a trilha sonora de Hans Zimmer é um exagero, atrapalhando com seus berros musicais e não valorizando o silêncio do espaço.
Nolan poderia saber que muitas vezes menos é mais. Ousou, ótimo, o cinema não pode ficar apenas girando em círculos, principalmente no mercado das superproduções hollywoodianas. Parece que a mensagem do longo longa, ‘de ir atrás dos seus sonhos e desejos’, foi assumido tanto por Nolan quanto pelo seus personagens. Mas o resultado não é tão espetacular quanto seu visual e sua fidelidade à realidade/gravidade de sua missão.
No fim, “Interestelar” é uma ficção complexa, capaz de deixar o espectador perdido na 5ª dimensão do tempo/espaço. Para o bem e para o mal.